Você sabe quem é Ilan Pappe?

por | ago 9, 2025 | Uncategorized | 1 Comentário

Por Melina Manasseh

Essa semana, em São Paulo, após uma breve visita a Flip em Paraty, Ilan veio a São Paulo em eventos relacionados a publicação de seu mais novo livro, “Brevíssima história do conflito Israel-Palestina”.

Ilan nasceu em Haifa, na recém ocupada Palestina em 1954. Cresceu e foi educado em meio as tradições judaicas e dentro do sionismo. Atuava como professor na Universidade e Haifa até que, devido ao seu posicionamento contrário ao regime de apartheid, especialmente em Gaza, ele é apresentado com a sua resignação, sendo efetivamente despedido e perseguido pelo seu próprio governo.

Para ele não houve um “acordar” para as práticas xenofóbicas de apartheid e de supremacia, como um estalo se não uma percepção contínua, uma certeza de que os valores da sociedade israelense estavam em desacordo com a humanidade, especialmente quando ele visitava, na memória, sua atuação no ano de 1973 em que era parte do destacamento das Forças de Defesa de Israel, na guerra de Yom Kippur, nas montanhas do Golan. Seus questionamentos aparecem estabelecidos em sua tese de doutorado em filosofia; que reescrita, dá início a sua carreira literária, assim que ele se forma na Universidade de Oxford. De seus diversos livros, os mais importantes: “10 mitos sobre Israel”, “Limpeza étnica”, “Lobby de Israel”, “A ideia de Israel” entre outros, fazem parte da literatura obrigatória para entender o contexto do que aconteceu em 7 de outubro de 2023.

“As universidades do mundo, as mais importantes, aquelas que formam as cabeças que irão reger o ocidente, todas foram cooptadas pelo lobby sionista e foi dado a elas, logo depois de 7 de outubro uma diretriz: retirar a palavra contexto de todas as aulas e discussões” – Relatou em palestra ministrada em 05/08 na Casa de Cultura Japonesa, palestra essa promovida pela USP.

Se para o sionismo descontextualizar é importante, porque isola o evento de 7 de outubro como um ato terrorista que automaticamente obriga o outro lado a responder, Pappe argumenta que esse fragmentarismo é funcional e tem um único propósito: seguir justificando o massacre do povo palestino e a apropriação do território palestino pelas políticas de assentamento.

Delator, juntamente com inúmeros autores judeus como Norman Finkelstein e Noam Chomsky das condições insalubres em que vivem os palestinos, Pappe declarou nos eventos em que falou abertamente para o público brasileiro, seja na Casa de Cultura do Japão, seja na Faculdade de Direito no Largo São Francisco, seja no evento da Flipei, evento esse que foi redirecionado para outro local, uma vez que o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes proibiu o evento na Paço das Artes devido a sua simpatia com o sionismo, Pappe disse repetidamente e em bom tom: “em todos os lugares por onde vou, encontro a população clamando por justiça aos palestinos enquanto que os governos pouco ou nada fazem para acolher essa demanda. O Brasil é o único lugar que eu já estive em que o governo se prontifica a reconhecer o sofrimento do povo palestino enquanto que a sociedade civil se divide e uma parte defende o sionismo”.

Curiosamente Ilan é testemunho de uma semana atribulada para a política brasileira, internamente e frente ao cenário global. Com o tarifaço, as ameaças ditatoriais trumpistas, os golpes dos deputados e senadores bolsonaristas às suas casas, as inúmeras tentativas de demolir o estado de direito democrático do Brasil; enquanto inúmeros ativistas se desdobravam para levantar as diferentes bandeiras dignas do momento histórico, o questionamento de Pappe é, quiçá, o mais importante de todos. Por que a extrema direita se vê tão ligada aos valores que eles identificam ser congruentes aos seus próprios, emblematizados pelo estado de Israel?

A evangelização a partir da década de 60 pode em parte dar conta de responder essa questão. Enquanto que a igreja católica nos países de 3º mundo, especialmente os da América Latina, pendiam para a esquerda, o liberalismo estadunidense entendia que era importante implantar no Brasil um arcabouço de valores sionistas velados, capitalistas descarados através da fé. Assim nascem as tantas assembleias de Deus, as diferentes igrejas que passam a ocupar bancadas inteiras nas câmeras, que embutem o brasileiro com um protestantismo deturpado e meritocrático que mais serve ao sistema colonial do que ao indivíduo como um todo.

Não há nada de curioso em perceber que sem contextualização não há história. Menos ainda perceber que o estado brasileiro está sob ataque e grande parte desse ataque se dá de forma vil e irrestrita e é direcionado a cada um de nós porque ataca a soberania e o direito do brasileiro de reger suas terras, suas águas, sua vida. Ataque esse que é propiciado por agentes mal-intencionados que direcionam o povo a desumanização de seus pares, de si e do povo palestino.

Pappe, ao ser perguntado o que mais o governo brasileiro pode fazer para que Israel interrompa o genocídio em Gaza, respondeu: “quando a União Europeia se posicionar como o Brasil, é sinal de que o Brasil pode ir um pouco mais adiante”. Ele sabe que o problema é a Europa e os Estados Unidos que além de cúmplices no genocídio, forçam ainda, em pleno séc. XXI políticas colonialistas para os países que consideram exploráveis. Vale lembrar que o Presidente Lula, diferentemente de governadores entreguistas e vendidos; diferentemente do ex-presidente e sua cúpula, tem sido um verdadeiro estadistas em se opor ao Trump e ao posicionar o Brasil como o que ele realmente é, um gigante.

Ilan, que você volte! Que você volte muitas vezes e siga nos agraciando com a sua presença, seus livros, seu conhecimento e seus questionamentos. Esperamos que sejam, no futuro sobre a reconstrução da Palestina, sobre como o estado da Palestina irá ser concebido, dentro dos possíveis contextos que isso se dará. Enquanto isso estamos a todo tempo tentando reconstruir o Brasil para que cada brasileiro saiba do seu valor, do valor das nossas matas, dos nossos rios, do valor da preservação dos nossos biomas, das nossas etnias.

1 Comentário

  1. Daniela Rodrigues

    Trago notícias sobre sua volta: arrisquei ir atrás dele para q assinasse um de seus livros q havia comprado. Estava com uns seguranças. Mas consegui ouvi-lo dizer, com um aceno: “voltarei em breve!”, e saiu do galpão Elza Soares com aquele jeitinho de dever cumprido!

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